Este post não é muito prático, trata-se mais de uma reflexão. Estamos em um estágio intermediário aqui no Brasil. Já não somos aquele país de terceiro mundo, mas ainda vivemos uma das maiores desigualdades do planeta. Não vejo essa desigualdade somente como uma questão financeira. Existe uma desigualdade de direitos: escolas boas e pagas versus escolas ruins e gratuitas. Hospitais excelentes e caros versus hospitais lotados e públicos. Claro, há exceções, por isso digo que vivemos em uma situação ainda intermediária. Não chegamos ainda a uma cidadania plena, uma consciência de nossos direitos e deveres. Vivemos em um país onde uns tem mais direitos que outros. E mal sabemos quais são exatamente nossos direitos e deveres.
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Eu li a respeito da expressão Cidadania Ativa faz já mais de 10 anos, quando pesquisava para meu primeiro livro sobre captação de recursos. Esse tema não saiu da minha cabeça desde então. É uma ideia forte: que além da consciência de nossos deveres e direitos, tenhamos uma postura ativa na própria sociedade. Essa postura serviria para nos definir melhor como cidadãos. Além de cumprir com meus deveres e beneficiar-me de meus direitos, desenvolvo ações em defesa de causas que acredito. Isso é basicamente a cidadania ativa.
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Cada cidadão poderia participar ativamente da sociedade envolvendo-se em uma ou várias causas. Isso pra mim completa o ciclo de viver em sociedade. Não me habituo à ideia egoísta de que somos somente seres isolados dos outros. Temos geneticamente um sentido gregário: nossas famílias, nossos amigos, nossos colegas de trabalho, nosso time de futebol… Mas parece que esses coletivos que nos definem sempre acabam por fortalecer uma ideia de exclusão: meu time é melhor que os outros, não há nada como minha família, meus amigos são os melhores… Criamos, inconscientemente a exclusão. Nos incluímos em algum coletivo, nos excluindo de todos os outros. E depois falamos sobre inclusão social, sobre a importância dos cidadãos serem incluídos na sociedade. Contra-sensos.
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Um estudo que li recentemente mostrava que os universitários americanos apoiam em média 1,9 instituições. Arredondando para 2, temos cada universitário americano apoiando 2 iniciativas onde ele atua como voluntário ou doando recursos. Você consegue imaginar a potência de um país onde cada jovem, já no início de sua fase adulta, atua para a melhoria de algo em sua sociedade? Eu não. No Brasil, como disse, ainda estamos as voltas de batalhar por direitos iguais, discutimos pouco nossos deveres, mas com certeza estamos ainda longe de uma postura massificada de envolvimento social.
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A cultura do envolvimento não está presente em nosso país. Campanhas de voluntariado deram a tônica nestes primeiros anos do milênio, mas não há dados que demonstrem uma cultura massificada. Por sua vez, sabemos que há uma cultura da doação, pouco estruturada, mas sólida e em constante crescimento. Não podemos negar que o brasileiro médio se envolve com campanhas de apoio a situações de catástrofe. É anualmente bombardeado por maratonas de solicitação de recursos pela televisão, como Criança Esperança e o Teleton. Nas grande metrópoles, apesar de desaconselhados pelos organismos municipais, há muitas crianças solicitando dinheiro nos semáforos e milhares de motoristas doam suas moedas, o que faz com que as crianças continuem ali. O sucesso dessa arrecadação se prova com as crianças ali. Um modelo absolutamente vicioso, prejudicial às crianças e a sociedade como um todo. Mas não podemos negar que o problema não é exatamente a falta de recursos e sim uma consciência maior por parte dos doadores.
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Um cidadão ativo seria um cidadão consciente. Não há como sermos conscientes de todas as causas do mundo, mas podemos ser conscientes ao menos de uma ou duas causas que acreditamos. A cidadania ativa é então como nosso curriculum. Eu apoio iniciativas de doação de sangue e de reflorestamento, outro apóia iniciativas com crianças, principalmente as com câncer, um terceiro participa de ações de conscientização da reciclagem. Cada cidadão, tendo suas causas, contribuiria com o todo, se envolveria de forma consciente pelo conjunto da sociedade, mas dedicado a uns poucos problemas dessa sociedade.
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O cidadão ativo é também um doador ativo. Não aquele das esmolas, mas o que doa para organizações que conhece e que divulga para os amigos. Sabe as questões principais da causa que defende e se sente feliz ajudando no que pode. E aí vem a importância deste tema: Temos que encontrar esses cidadãos. Eles são nossa maior riqueza, temos que envolvê-los, capacitá-los. Sair do ciclo da doação esporádica para doações e participações constantes. Até o ponto onde eles, grande parte deles ao menos, se orgulhe e diga para os outros sobre a causa que ele se envolve e sobre sua ONG.
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Foi-se o tempo do assistencialismo puro e simples. A filantropia, aos poucos, cede lugar ao investidores sociais, que buscam resultados concretos, não só nos números mas principalmente na garantia de novas autonomias. A defesa de causas se relacionam hoje em dia a estratégias que garantam a saída do ciclo da miséria, nos casos de atendimentos a indivíduos em risco social. Novos mecanismos de garantias ecológicas que também garantam desenvolvimento econômico. Atendimentos de saúde que busquem não só minimizar conseqüências mas também buscar curas, garantir políticas públicas, minimizar danos. As ações sociais hoje buscam aliados nos setores empresariais, governamentais e fundacionais para que, juntos, inovem na solução de problemas. Não se trata de doações ou patrocínios mas sim de recursos que garantam saltos, melhorias, soluções. Esse é o mundo das novas tecnologias sociais, presentes nas mais diversas manifestações de coletivos humanos.
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Ao mesmo tempo, sabemos que para cada ação inovadora, existem dezenas, talvez centenas de instituições repetindo as mesmas rotinas de sempre. Não é proposital, mas acaba sendo prejudicial para o desenvolvimento. Milhares de ONGs atuam com parcos recursos, muitas vezes agindo isoladamente, quando poderiam desenvolver pressão por políticas públicas garantidoras. Milhões de doadores ainda contribuem mais por culpa do que por estratégia. E com isso geram a repetição do ciclo, sentindo a ideia de um problema infinito, enxugando gelos imaginários. Milhares de empresas recebem centenas de projetos sociais buscando patrocínios. Não há, em nenhum desses casos citados, um esforço para um trabalho em rede, para a real resolução de problemas. Há uma espécie de competição por recursos ao invés de uma colaboração por resoluções, sejam locais ou temáticas.
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Diz a lenda que todos os problemas do mundo já foram resolvidos em algum canto do planeta, mas não houve até agora um real desejo de buscar, avaliar e reproduzir essas soluções em outros ambientes. Talvez bastaria com que cada um fizesse sua parte, mas que essa parte estivesse conectada a algo ou alguém além dele mesmo.
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Aposto em que em 10 anos estaremos bem mais envolvidos, mais dedicados a causas, mais ativos em nossas participações nas melhorias do nosso país e no mundo. Porque eu acredito nisso? Porque é o que estamos fazendo oras. Você e eu!
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Fonte: Adaptado de Marcelo Estraviz, Um Dia de Captador.
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