Temos uma situação curiosa no Brasil. Existe uma cultura forte do voluntariado. Ela se expandiu na última década com a criação de centros de voluntariado esparramados pelas cidades e ações de voluntariado empresarial realizados pelos departamentos de recursos humanos de grandes empresas. Ao mesmo tempo, as entidades não estão, em sua maioria, muito abertas a esse tipo de contribuição. Ou se estão, confundem-se e buscam voluntários que substituam trabalhos necessários e constantes, que nunca poderiam ser realizados por voluntários, que tem como característica a sazonalidade e – infelizmente – inconstância das horas vagas. Há avanços nessa questão de treinar entidades e voluntários para a responsabilidade da disciplina do trabalho pactuado. Mas ainda vejo um longo caminho pela frente para que as entidades percebam as vantagens de um grande grupo de voluntários defendendo a causa assim como uma cultura voluntária onde a maioria das pessoas tenha como hábito contribuir regularmente com algumas horas de seu tempo para uma causa social.
Enquanto que no trabalho social direto é complicado combinar um desejo de um voluntário com uma atividade direta da entidade, na mobilização de recursos todo voluntário é muito bem vindo. Primeiramente por um simples motivo: ele em si já é um recurso e por isso tem valor. Mas principalmente porque para captarmos recursos precisamos de muita gente, que conhece mais gente, que conhece mais gente.
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Em eventos de arrecadação, os voluntários são o público ideal para participar e se possível, inclusive organizarem tudo. Estão com energia disponível e em abundância. Já os funcionários da entidade, em situações
como essa, tem que trabalhar uma jornada dupla: um dia inteiro de tarefas somada a um jantar beneficente.
Organizações que conseguem encontrar um pequeno grupo de voluntários acabam percebendo um potencial não imaginado de recursos. E leve em consideração que um voluntário é muito mais sensibilizado pela causa geral do que pela entidade em particular. Aproveite isso ao invés de minar essa energia. Os gestores e funcionários têm como hábito tratar de questões da rotina da entidade. Tais questões não são do interesse dos voluntários. Eles estão ajudando porque querem minimizar os problemas das crianças com câncer, ou da floresta amazônica, ou dos moradores de rua. Eles atuam de acordo com as mesmas motivações que tínhamos quando resolvemos trabalhar na área social. Só que depois de tantos anos, nos tornamos um pouco burocratas. Já os voluntários, que decidiram dedicar-se algumas horas por semana, tem toda uma energia preparada para atuar. Eles querem se livrar da burocracia que tem no seu dia a dia para desfrutar de um ato solidário. Deveríamos nos inspirar neles ao invés de enchê-los de tecnicismos e especificidades de nossas entidades. É difícil, mas tente. Verá um resultado virtuoso.
Em outros países existe uma atuação bem mais dirigida para o envolvimento de voluntários nas organizações. Aqui no Brasil muitas vezes surge um voluntário querendo ajudar em qualquer coisa e a organização não sabe como recebê-lo. Perdem‐se enormes riquezas nessas horas de incerteza. Em geral o voluntário volta pra casa frustrado sem ter conseguido algo que o agrade. E acredito que esse voluntário terá muita dificuldade de se envolver novamente nessa ou qualquer outra entidade no futuro. Na Europa e nos EUA é comum encontrarmos sites
especializados em vagas de voluntários. O bacana disso é que trata-se de vagas bem específicas. “Procura-se professor de inglês voluntário para dar aulas as terças e quintas das 10 da manhã às 11 horas.” Com certeza existe um voluntário que se encaixa perfeitamente nessa necessidade. E assim não ocorre uma situação embaraçosa que se pauta pela disponibilidade do voluntário que apareceu, para dar aulas as sextas a tarde, de espanhol. Se a entidade se pautar por essa possibilidade do voluntário, terá que mudar toda sua rotina com os atendidos, correndo ainda o risco de que exista falta de interesse em espanhol, ou até algo pior, que o voluntário, de repente, desista, o que infelizmente é bem comum.
Vamos deixa claro também que não cabe buscarmos voluntários para atividades imprescindíveis. Vejo com freqüência organizações buscarem contadores voluntários, professores voluntários, captadores voluntários! Isso não cabe. O que é estratégico deve ser profissionalizado. O voluntariado não é um mecanismo de economizar custos e sim potencializar o trabalho pela causa. Cabe um professor de idiomas para uma entidade que trabalha com adolescentes porque o idioma é um plus no serviço. Mas não cabe buscar professores voluntários se a entidade atua somente com formação. A não ser (sempre há exceções) que a entidade atue somente com voluntários, o que requer outras estratégias, envolvendo forte formação de voluntários principalmente para objetivar o compromisso contínuo.
Mas vamos supor que sua entidade não atua somente com voluntários (o que é a maioria dos casos). Situações como essa devem gerar então uma clareza do que é tarefa profissional e tarefa acessória mas
potencializadora. E é esse caso que quero destacar aqui: Tarefas potencializadoras para a causa, movidas por atividades voluntárias. Pode ser na organização de um jantar, pode ser na venda de camisetas em uma escola privada, na campanha de conscientização da reciclagem em uma avenida grande da cidade. Conheço casos de voluntários que se rodiziam na loja da entidade, ou que se dedicam a esclarecer dúvidas por telefone sobre doenças específicas.
A atividade voluntária é o que há de mais nobre numa ação social. Porque nós, bem ou mal, somos trabalhadores assalariados. Um voluntário se dispõe a usar um tempo livre, que poderia estar dedicando à família, a um bom livro, ao descanso. Valorizar o voluntário não é treiná-lo a trabalhar como nós trabalhamos e sim sensibilizá-lo e motivá-‐lo a fazer o melhor possível. Provavelmente sem nossa técnica, sem nosso profissionalismo, mas com uma energia que é bem provável que já tenhamos perdido. Um pedaço.
Existem alguns celeiros de voluntários que cabe mencionar. Um deles é o setor de educação. Desde a escola básica até a universidade. O mais comum que encontramos por aí é a parceria entre especialidades e demandas. Um exemplo é odontologia. Os alunos precisam treinar a ser dentistas e assim sendo, nada melhor do que fazer isso com entidades sociais. Acho que hoje toda universidade tem suas parcerias nessa área. Mas podemos expandir isso para todas as outras: Psicologia, Nutrição, Engenharia, Publicidade, Direito, absolutamente todas. Também podemos ir além e negociar parcerias diretamente com os alunos. Podem envolver-se em campanhas de arrecadação e em alguns casos organizando o próprio evento. Festas de fim de ano organizadas pelos diretórios acadêmicos podem reverter parte da renda a entidades parceiras. As ideias são infinitas. E deixe que eles próprios sugiram coisas.
Outro celeiro cheio de oportunidades é a empresa próxima à entidade. Várias já têm seu setor de voluntariado corporativo mas mesmo nas que não tem, sempre há gente disposta a organizar alguma atividade com funcionários. Em geral isso está a cargo do departamento de recursos humanos. Mas existem casos onde tudo começa com um funcionário mais ativo, que mobiliza os demais a fazer algo. Todo mundo na empresa sabe quem é essa pessoa. Geralmente pede um dinheiro no fim do ano para comprar brinquedos para crianças ou simplesmente atua em uma entidade como voluntário em alguma entidade. Ter esse funcionário do seu lado é o seu objetivo.
Não poderia deixar de destacar aqui um tipo de voluntário que muito me agrada: as “senhorinhas”. Nós somos um país com um quadro de maioria jovem mas em breve a maioria das pessoas serão da chamada terceira idade. É um problema que o governo terá que enfrentar. Como garantir que a população economicamente ativa garanta recursos para a previdência dos aposentados? Como não sou gestor público deixo esse problema de lado e contribuo com uma sugestão: Por mim, eu colocaria todo aposentado (que tivesse interesse, claro) pra trabalhar como voluntário. Eu fico impressionado como brilha o olho dessas senhoras que se dedicam a fazer o bem ao invés de ficar em casa assistindo TV. Claro que falo senhoras mas não descarto a contribuição de senhores. É que eles são minoria. Mas conheço alguns geniais. Um que virou motorista. Leva as crianças pra cima e pra baixo e ainda puxa assunto no trânsito. Outro que se dedica a concertar coisas que quebram. Sim, existem os senhores. Mas as senhoras… Adoro essas senhoras! Elas se maquiam, colocam o vestido mais bonito e vão a luta, sempre em grupo, no mínimo em duplas. Costuram, vendem, organizam. Fazem de tudo. Estão felizes em ajudar mas principalmente por sentirem-se ativas. Muitas já me disseram que nunca se sentiram tão felizes na vida.
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Fonte: Marcelo Estraviz, Um Dia de Captador.
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